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Dar o exemplo
A ferramenta de pirografia estava comprada há muito tempo, madeiras velhas prontas para reutilizar mas a ocasião não surgia.
Na viagem de regresso após o funeral do meu avô finalmente soube o que queria que fosse a minha primeira pirogravação. Ele não quis nenhuma cerimónia especial, não queria uma lápide, mas havia uma frase que não me saia da cabeça. “Lead by example”. Numa tradução bruta fica algo como “Liderar por exemplo”, em português acho que fica simplesmente pelo “dar o exemplo”.
O meu avô tinha sempre histórias para contar, ele foi um revolucionário, um sonhador que ia para além da política. Ele tinha uma mente aberta o suficiente para dizer que inacreditável era acharmos que apenas o nosso planeta era habitado. Ele tinha ideais sociais e políticos ao mais alto nível mas tinha o descernimento para admitir que a humanidade não estava nem perto de poder implementar o que ele acreditava ser um mundo realmente justo.
Por ele conheci como era o país antes da revolução, como os revolucionários se desenrascavam brilhantemente para comunicar e reunir numa altura em que tudo tinha de ser secreto, com a PIDE em cada canto. Aqueles foram os tempos em que os amigos e familiares se afastavam se abordasses temas como liberdade ou ousasses pensar de uma forma menos conservadora.
Mesmo antes desses tempos, haviam tantas histórias para contar, como ele cresceu e saiu de uma situação em que quase passava fome e trabalhou por comida, para aprender sozinho electrónica, línguas e tantas outras coisas numa vida onde teve muitas profissões e onde era das pessoas mais bem informadas que conheci.
Actualmente consideraríamos o meu avô um exemplo de empreendorismo, no fundo ele criou vários negócios e sempre foi o seu próprio patrão.
Para mim o maior orgulho vai para além do empreendor, vai para o facto de ele ter sido o verdadeiro 4everstudent.
Se o vissem nos seus noventas a perguntar-me sobre o Facebook e a Internet, um homem que mandava mensagens de texto quando pessoas com metade da idade dele tinham medo de mexer num telemóvel.
Ele estava cansado no fim, mas havia sempre um brilhos nos olhos quando falava de política ou de como podíamos fazer do mundo um lugar melhor.
Sempre que nos encontrávamos a conversa acabava por ir para a ideia dele que tinha de comprar um computador, perceber melhor “aquela coisa do facebook”.
Penso que o meu avô, na sua sabedoria dos noventa, sabia que podia encontrar e partilhar toda a informação que quisesse nesta maravilha que é a Internet.
Nós tínhamos uma aposta entre os dois, quem “chegaria primeiro” aos 120 e tenho a certeza que se ele não tivesse ficado cansado quando ficou, ele ganharia a qualquer pessoa na forma como tirar partido das apps sociais e da tecnologia em geral. Aprendendo e partilhando como o estudante que permaneceu até ao fim.
(Ele não acreditava em Céu mas se ele estiver lá agora, tenho a certeza que ele está a aprender e testar coisas que ainda nem me apercebi que existem. Obrigada pelo exemplo avô, és o maior!)